Scimone por Scimone

no Festival de Almada

Joana Gorjão Henriques in Público, 9 jul 2003

Os Artistas Unidos deram a conhecer as peças de Spiro Scimone, a Cinemateca mostrou o seu cinema, “Due Amici”, e agora é a vez de o autor, encenador, realizador e actor se revelar em palco: Spiro Scimone por Spiro Scimone pode ser visto hoje e amanhã em “A Festa” no Festival de Almada (Teatro Municipal de Almada, às 18h).

A encenação é de Gianfelice Imparato e no palco, ao lado de Scimone, está Francesco Sframeli, com quem o autor formou uma dupla (conhecem-se desde a adolescência, estiveram juntos no Piccolo Teatro di Milano, criaram uma companhia).

E que festa é esta, celebrada a três (há ainda o actor Nicola Rignanese), com Scimone a fazer de mulher? É um drama travestido de comédia, protagonizado por uma típica família italiana – a mulher, o marido e o filho – na qual o machismo serve de motivo e espelho de tensões familiares em suspenso, sempre prontas a disparar.

É também o quotidiano dos deserdados que Scimone põe a gravitar à volta de um aniversário: é sobre eles, “os que não têm palavra”, que Scimone fala nas suas outras duas peças, “Café” e “Nunzio” (que deu origem ao filme “Due Amici” premiado no Festival de Veneza em 2002).

O dramaturgo – que escreve para poder continuar a ser actor, dizia ao PÚBLICO no ano passado – faz parte de um grupo de autores responsáveis pela renovação da dramaturgia italiana. Uma dramaturgia que tem passado pela escrita em dialecto, mas que reinventa a língua e a tradição local, como disse Franco Quadri, crítico do jornal “La Repubblica”, em entrevista à revista francesa “Mouvement”. Porquê uma renovação centrada no dialecto? Quadri, que diz que “a língua teatral italiana parece um ‘patchwork’ de idiomas”, defende que é uma reacção à linguagem artificial, ao tom neutro da rádio ou das dobragens cinematográficas.

“A Festa” é a única das peças de Scimone escrita em italiano (e também a única com três personagens): Scimone tem escrito no dialecto de Messina, cidade portuária da Sicília onde nasceu em 1964. Para ele a palavra escrita deve ter “boca” porque “o teatro é língua oral”, e os seus textos são escritos a pensar numa “relação verdadeira e muito rude” entre actores. “Peço que exista uma escuta entre os actores de modo a permitir que aquelas palavras tão banais tenham peso. Provoco um jogo de escuta muito intenso e profundo. A morte do teatro é quando os actores não ouvem, mas apenas falam.”

Em Outubro, os Artistas Unidos, vão encenar “A Festa” no Teatro Taborda, e acaba de ser editada, na colecção Livrinhos de Teatro dos AU, juntamente com as outras duas peças, traduzidas por Jorge Silva Melo, com a colaboração de Alessandra Balsamo e Américo Silva.

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