Luís XIV eu é que sou o rei de França

Joaquim Benite encena 'Poder' de Nick Dear. Até 15 de Maio, em Almada

Maria João Caetano in Diário de Notícias | 07 abr 2005

Foi a 17 de Agosto de 1661, na festa que o superintendente das finanças Fouquet lhe ofereceu no castelo Vaux-le-Viconte, que Luís XIV descobriu exactamente que tipo de rei queria ser como o sol, que está no centro de tudo, que ilumina em todos os sentidos, que, parado, parece estar sempre em movimento. Teria de ser ele, e não Fouquet, o proprietário do maior e mais belo palácio e dos mais perfeitos jardins; seria ele o mais rico de todos os nobres; ele daria as maiores festas, com o mais espectacular fogo de artifício e com os melhores comediantes – entre eles o dramaturgo e encenador Molière e o compositor Jean-Baptiste Lulli.

É o nascimento do rei-sol que o dramaturgo inglês Nick Dear nos mostra em Poder, a peça que hoje se estreia no Teatro Municipal de Almada, com encenação de Joaquim Benite. A acção inicia-se com a morte do cardeal Mazarin, até então regente, e com Luís XIV decidido a tomar para si o governo do Estado. O austero Colbert passa a controlar as contas públicas e chama a atenção para o facto de Fouquet ter uma fortuna conseguida à custa de “contabilidade criativa”, vulgarmente conhecida como corrupção. Em 1664, após um longo processo em tribunal, Fouquet é condenado ao desterro, mas, temendo uma revolta organizada no exterior, Luís XIV altera a pena para prisão perpétua.

Foi este lado trágico da personagem de Fouquet (numa interpretação de Marcos D’Arede) que mais interessou o encenador. Fouquet, um amante das artes e impulsionador das ciências, um homem que “via para além do seu tempo”, um mulherengo tão entusiasmado quanto patético, “acaba por cair nas malhas do seu próprio pensamento” e vê o rei roubar-lhe o dinheiro e imitar-lhe o estilo de vida. Porquê? “Porque posso”, justifica o rei. Luís XIV inaugura a política-espectáculo, “e isso ainda é muito actual”, refere Benite.

Mas Nick Dear vai um pouco mais além, ao mostrar também como “o poder está tantas vezes associado a outras facetas da vida, como o sexo”. As conquistas amorosas, os ciúmes, as saias do príncipe Filipe e os filhos bastardos de Luís são mais do que fait-divers neste espectáculo onde se mostra como a corrupção está tão intricada na fundação do chamado Estado moderno.

Teresa Gafeira, Rui Neto, Bruno Martins, Joana Fartaria, Francisco Costa e Kjersti Kaasa completam o elenco de Poder, em cena até 15 de Maio em Almada.

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