Festival de Almada na recta final

 in Diário do Sul, 23 Julho 2021

O Festival de Teatro de Almada, que nesta 38º edição tem vindo a assinalar a passagem dos 50 anos da Companhia de Teatro de Almada(CTA), está na sua semana derradeira. Esta efeméride deu o mote a um ciclo comemorativa de quatro “Encontros da Cerca”, sobre os diversos períodos da companhia, o último a ter lugar no próximo sábado, pelas 15h. sobre “o Teatro Azul”, após 2006. Mas o espaço mais importante dedicado aos 50 anos da CTA é certamente a excelente exposição, já referida em crónica anterior, Uma árvore com espectadores à volta, do cenógrafo, o amigo, José Manuel Castanheira que nos conduz a uma viagem por tão diversos registos cénicos e latitudes por onde a CTA deambulou na divulgação da arte teatral e na criação de público, de que este festival é exemplificativo.

Amitié, Aurora Negra, Fake, ou Omma

Ao longo do festival e de entre os espectáculos a que tivemos acesso – excepto nos acontecidos no TNDMII e no CCB, como referimos na edução de 2 de Julho – de referir Amitié de Eduardo De Filippo e Pier Paolo Pasolini, encenação de Iréne Bonnaud. Uma coprodução de sete companhias de referência estreado em 2019 no Festival d’Avignon, com interpretação por três nomes maiores dos palcos franceses: François Chattot, Jacques Mazeran e Martine Schambacher.

Um espectáculo com uma força e uma intensidade pouco comum. Teatro puro, sem rede, sem subterfúgios, ou de como um bom texto – carregado de humor, com uma boa encenação/direcção de actores e um desempenho de excepção fazem deste um dos melhores espectáculos presentes neste festival. Três actores – dois e uma actriz – e uma hora e 40 em que um texto versátil, exigente, onde humor e imaginação transbordam a cada momento, com um cenário simples, sem rede – ao contrário de como por vezes, um complexo cenário ou o emprego de efeitos especiais “disfarçam” o que seriam espectáculos ocos sem estas ou outras muletas.

“A sinopse de Pasolini, redigida sob a forma de uma narrativa oral, ao modo dos contos ou das parábolas de Novo Testamento, era destinado a um road movie cinematográfico. É pois debaixo, de uma Estrela de Belém, ao jeito de um letreiro luminoso de um motel abandonado, que contamos esta história de Pasolini e representamos as cenas escritas por Eduardo De Filippo, com um mínimo de acessórios e mudanças de figurinos muito rudimentares e quase imperceptíveis. Para ele [Pasolini], a humildade era a maior virtude da arte, por contraste com a estética do «grande espectáculo porno-teológico» fórmula que era suposto vir a dar título ao seu filme (…)” ao contrário de “Essa arte pobre, «de roupagens remendadas mas limpas» é a do teatro que queremos fazer.”

Aurora Negra foi também um espectáculo interessante. Resultado de uma coprodução TNDMII, Centro Cultural Vila Flor, O Espaço do Tempo e Teatro Viriato, com criação e direcção artística de Cleo Diára, Isabél Zuaa e Nádia Yracema, Espectáculo muito vivo, cheio de musicalidade, de cor e alegria – e alguns efeitos especiais de luz e imagem – três mulheres em palco celebrando a vida, donas e senhoras de si: “Meu corpo eu te autorizo a ocupar qualquer lugar”, contracenando em três línguas , as suas memórias “de mulheres negras no Portugal pós-colonial e por descolonizar”, “numa celebração da jornada e subjectividade colectiva de uma geração afroportuguesa contemporânea”, neste espectáculo vencedor da segunda edição da Bolsa Amélia Rey Colaço onde encontramos, todavia, um excessivo exacerbar da africanidade, denunciando um racismo primário, que neste leitura acaba por tornar o espectáculo mais redutor do que se esperaria da vitalidade cénica que este denota.

Referências ainda Fake, da Formiga Atómica, Lisboa, texto de Miguel Fragata e Inês Barahona, encenado pelo primeiro, com Anabela Almeida, Carla Galvão, Duarte Guimarães, João Nunes Monteiro, Beatriz Batarda e Sandra Faleiro, com interpretação vídeo de Beatriz Batarda, Cirila Bossuet, Isabel Abreu, Madalena Almeida, Márcia Breia, Sandra Faleiro, Sílvia Filipe e Teresa Madruga.

História delirante a partir de uma famosa escritora de romances policiais, Norma B, autora Como Assassinar o Seu Marido., ele um famoso professor de culinária.

E ainda Omma, de Josef Nadj, pelo Atelier 3+1 (França), fruto de uma vasta coprodução, onde o coreógrafo acaba por regressar à essência da dança “ao trabalho da simplicidade, concentrando-se no movi, na voz, no fôlego e na musicalidade.”

Em palco oito bailarinos negros ou uma hora de êxtase na busca da essência do movimento.

No Teatro Nacional

Entretanto temos vimos a acompanhar e recente e excelente programação no TNDMII onde no final mês passado assistimos à estreia de um excelente espectáculo, no passado Calígula morreu, eu não, uma coprodução entre o TNDMII e o Centro Dramático de Madrid, um magnifico espectáculo, bilingue interpretado, na quase totalidade, por portadores de vários tipos de deficiência.

No passado dia 17 foi estreia de Coleção de Espectadores, autoria e encenação de Raquel André, um belo espectáculo que iniciando-se quase como se fosse uma visita guiada ao Teatro, conduzindonos a aspectos que o espectador normalmente desconhece ou não valoriza. Neste caso, também com interpretação de não profissionais, é sobretudo uma declaração de amor ao teatro, que une encenadora e interpretes/público amante do Teatro, espectáculos que talvez fosse interessante vermos na próxima edição Festival de Almada.

E porque o Festival de Almada, edição 38º, aproveite os espectáculos a que ainda pode assistir: Lorenzaccio, Um gajo nunca mais é a mesma coisa, Viagem a Portugal, Mlly Bloom, Miguel de Molina al desnudo ou Discurso sobre o filho-de-puta.

Informe-se em WEBSITE – www.ctalmada.pt;
FACEBOOK – www.facebook.com/festivaldealmada;
INSTAGRAM – @festivaldealmada

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